domingo, outubro 14, 2007

Sono reparador

Maria não seria capaz de dizer o que estava sentindo. Os sentimentos misturavam-se, confusos, em seu peito. Sabia não ser tristeza, mas não conseguia definir.

Sorriu ao pensar que, pelo menos, sabia o que "não" era. Já havia dado um passo em frente.

Movimentou-se, impaciente, em sua cadeira. Algo no ar... Algo que a incomodava. E começou a jogar com as armas de sua profissão (abandonada). Jogou palavras e fatos ao ar... em busca da resposta.

Neste Domingo o Horário de Verão estava começando. Maria não gostava deste horário. Eis que lembrou da noite anterior. Quando deitara, adiantara o relógio em uma hora. E, no mesmo instante, pensou:
-"Começou o tempo que eu não gosto".
Não gosto.... isto um cristão não deve dizer. Pois todos os dias são graças e bençãos de Deus. E a cada dia, mais graças, mais bençãos, são derramadas na nossa vida. Mas o verão, com seu calor insuportável, mosquitos, cansaço constante devido ao mal estar que o calor deixa no corpo... tudo isto a incomodava.

Neste Domingo estava sem poder trabalhar. Faltava material. E ela dedicou-se ao estudo. Alguns a deixaram triste, pois não conseguiu estudar- dúvidas e problemas com os programas que não sabia como solucionar. Entregou-se ao desenho e animação - desta forma ocuparía seu tempo e aprendería.

Muitos fatos contribuiram para o bem-estar de Maria na semana que havia passado. No entanto, o próprio bem-estar lhe dava a incômoda sensação de que estava, agora, vazia. Antes o sentimento lhe acompanhava. Mas,exatamente por isto, sem ele nada estava preenchendo o seu coração. Era uma situação "sui generis". Não tinha objeto para direcionar seu pensamento.

Lembrou-se, também, de amigos que estavam se aproximando. Amigos novos, amigos de algum tempo. Lembrou-se de que ganhara um irmão virtual. Lembrou-se do dia lá fora, com sol e céu azul. Lembrou-se de que estava sentada na frente do PC, sozinha, a escutar música. E jogou mais palavras:

Dúvida, anseio, solidão, retração, ressentimento, falsidade, saudade, aversão, bula, almoxarifado, sentimento, musicas, hortências, flores, relógio de flores, avenida, carros, estradas, jumento, autêntica juventude, horror, acidente, enxofre, ramada, sujeira, vassoura, beijo, casal, unidade, carícia,dança, dança com lobos, filme, televisão, reportagem, verídico, cuidado, porta, sufoco, cansaço, serventia, operação, viagem, situação cômoda, angústia, autenticidade, confirmação, autoridade, camaleão, suavidade, sentimentalismo exagerado, efusão, efusão do E.Santo. Conversão, arrependimento, reparação, eternidade, felicidade, amor.

Restava, agora, juntar as palavras e tentar decifrá-las. Nada incômodo. Pois estava, realmente, sem ter o que fazer.

Não sabia exatamente o porquê. Mas o próprio fato de escrever as palavras, e relê-las, havia aliviado seu peito.

Sentiu sono. Há pouco acabara de almoçar. E, como não podia deixar de ser, a moleza se instalava no seu corpo após o almoço. Não era consigo apenas. Todos sentiam. Nem sempre podiamos descansar como seria conveniente. Mas, hoje, Maria podia.

Saiu da frente do monitor e do teclado, sentindo-se calma e tranquila. O sono a embalava. A música suave dormitava com ela. E, nas mãos que escreveram, a cura para um estado momentâneo de insatisfação.

Todo seu ser se direcionava para que fechasse os olhos e se entregasse ao sono reparador. E Maria não lutaría contra isto.

by Miriam, antes de sair para descansar.

3 comentários:

Anônimo disse...

mais uma bela história ;) tens que fazer um livro, miriam!!! ;)

somentebia disse...

Amiga querida, finalmente consigo acionar o sistema de comentários. Nem imaginas a dificuldade que tenho tido nos 'blogspot', não sei se somente comigo está acontecendo essa impossibilidade. No post anterior tentei por diversas vezes sem lograr êxito. Estive visitando a tua página pessoal e voltei de lá encantada, maravilhada não só com tuas belas poesias como também com a escolha das músicas.

Quanto à postagem atual... ah, essa Maria que nos fascina com seus mistérios, quando revelada assim em fragmentos que mostram um interior tão rico quanto sofrido. A 'Maria' das emoções de muitas de nós, tão bem refletida aqui: "No entanto, o próprio bem-estar lhe dava a incômoda sensação de que estava, agora, vazia." Quantas vezes me senti assim, amiga, aprisionada num bem-estar tão grande que eu mesma não cabia dentro dos meus mistérios, e isso me incomodava... me incomoda!

Muitas vezes, Miriam, ler-te é como vislumbrar as minhas emoções a passearem por tuas palavras. Tens o dom de decodificar os sentimentos mais enraizados e por vezes intradutíveis que assomam à alma da gente. Tens o dom da palavra, amiga!

Queria dizer-te que a música Serenata de Schubert, fundo musical da tua bela poesia Momento, e agora ouvida aqui (tão lindo momento!) também me traz muitas recordações e foi também fundo musical de um grande momento em minha vida. Não a conhecia nessa intrepretação, por sinal belíssima!

Amiga, pelo que vejo irás sair de férias, por isso quero desejar que teus dias tenham a paz necessária ao teu coração, mas que venham com muitas alegrias, festividades, novos conhecimentos, novos lugares, e também um tiquinho de descanso (rs), pois as férias são feitas para repor energias, não é mesmo?

Deixo-te pétalas de perfumadas e mimosas flores, um beijo no coração, e muito carinho pra te acompanhar e trazer-te de volta logo para o nosso convívio. Prometo vir regar tuas 'flores' na tua ausência.

Susana Júlio disse...

Maria...lembrei-me de Marisa Monte...tem uma música que fala da Maria.
Marias somos todas nós e todos nós...eu sou Maria de nome e essa Maria que descarrega os seus sentimentos através das palavras como verdadeiros exorcismos das almas...mas que se perde tantas e tanta vezes na escuridão da noite apenas interrompida pelos pesadelos e pelos seus fantasmas...
Por enquanto continuo cinzenta e assombrada...

Beijo grande...

P.S.Continuo sem conseguir aceder à tua página pessoal... :(((